Matematica
A influência dos dedos da mão é que explica a base decimal de nosso sistema de numeração. Entre as tribos mais atrasadas da África e da Austrália, existe um sistema de numeração cuja base não é 5 (povos que aprenderam a contar com uma só mão), nem 10 (as duas mãos), nem 20 (as mãos e os pés, como o sistema dos maias e astecas, que dividiam o dia em 20 horas). Trata-se do sistema binário (base 2), adotado por exemplo entre os papuas da Nova Guiné. Essa gente não aprendeu ainda a contar com os dedos, e possui sinais independentes para designar um e dois, e depois algumas combinações para exprimir os números até seis. Além de seis, emprega-se uma palavra que significa "montão".
Uma questão de base
O sistema binário só requer dois símbolos, 0 e 1, por meio dos quais se podem expressar todos os outros números. Por exemplo, 1 + 1 não pode ser escrito 2, mas 10. E essa base numérica, a mais primitiva de todas, já encontrou na eminente figura de Leibnitz um defensor entusiasta. Csse matemático alemão nela viu a própria imagem da criação do universo, considerando que a unidade (1) representava Deus e o zero (0) simbolizava o nada. Assim como o Supremo criou todos os seres a partir do nada, esses dois sinais exprimiam todos os números possíveis e imagináveis.
A vantagem da base dois é a economia de símbolos e maior simplicidade das operações. Há menos regras para multiplicar ou dividir mas — evidentemente — quem não está acostumado achará muito mais difícil. No sistema decimal, temos que decorar cem resultados de soma e cem de multiplicação, enquanto o sistema binário reduz a tabuada a duas regras apenas:
1 + 1 = 10 1 X 1 - 1 Essa vantagem é contrabalançada pela
necessidade de muitos sinais para representar os mesmos números. Por exemplo:
1 000 000 000 000 (na base dois)
Ainda assim, uma mudança de base em nosso sistema de numeração já foi várias vezes proposta e defendida. Mas, na verdade, a adoção do sistema decimal pela humanidade é um fenómeno fisiológico, e talvez o sistema binário de numeração, fosse-historicamente viável se o homem tivesse, em lugar de dez dedos flexíveis, apenas um toco em cada mão. Enquanto o homem contar por dezenas, seus dedos lhe recordarão a origem do passo mais importante de sua vida mental.
O velho encontra o novo
Não deixa de ser paradoxal que inteligências primitivas, como os papuas, se utilizem do mesmo sistema numérico dos atuais computadores eletrônicos. Salários de grandes empresas, sinais enviados por satélites artificiais, resultados de exames vestibulares — tudo isso e muito mais, o computador analisa matematicamente por intermédio da corrente elétrica. Êle só pode indicar a existência ou a ausência de fluxo, sendo as duas alternativas representadas por dois símbolos (0 e 1) e suas combinações. O sistema binário é que permite o agrupamento automático dos dados e dos resultados tendo em vista o cálculo mecânico.
Por que o computador usa essa base? É simples entender: uma chave elétrica só pode estar ligada ou desligada. À falta de' corrente se associa o símbolo 0, à passagem de eletricidade se associa o símbolo 1. A representação de dez símbolos (0 a 9) exigiria uma corrente proporcional a cada número, dando margem a erros pela variação da corrente. Já no caso da base binária,, a possibilidade de confundir uma situação "com corrente passando" e outra "sem corrente" é praticamente fmla. Além disso; a corrente elétrica pode ser ligada ou desligada no tempo extraordinariamente curto de IO6 segundos (1 milionésimo de segundo ou 1 microssegundo). E os cálculos, que levariam meses se feitos a mão, realizam-se no computador em poucos minutos.
O salto para o infinito
Para o primitivo, e mesmo para o filósofo antigo, os números estão impregnados de natureza. Para o homem civilizado de hoje, o número natural é um ente puramente matemático, uma conquista de seu pensamento. Com essa atitude, esquecido da origem humilde do número, e abstraindo-se da realidade imediata, o homem generaliza seus conceitos e estende ao máximo o campo de seu raciocínio.
Só uma criança de 5 anos, ou um selvagem dos mais atrasados, pode pensar que existe um número maior que todos os outros. Na sucessão dos números naturais 1, 2, 3, 4 ...
as reticências indicam que faltam, números a escrever. Quantos? Naquela sucessão, passa-se de um número para o seguinte juntando uma unidade. Dado qualquer número n, por maior que seja, sempre se pode efetuar sobre êle a mesma operação mental, e obter um número maior n + 1- Logo, a sucessão é ilimitada, e existem infinitos números naturais. Para dar essa ideia, escreve-se assim:
1, 2, 3, ... n, ...
Esse mesmo princípio ãe extensão pode ser aplicado ao conjunto dos pontos de uma reta. Tomando ao acaso dois elementos A e B desse conjunto (dois pontos da reta), o segmento AB assim definido pode ser dividido ao meio. Repetindo a operação nos dois novos segmentos formados, teremos quatro segmentos menores. Teoricamente, a divisão ao meio pode repetir-se ilimitadamente, e o segmento AB constará de uma infinidade de pontos: o conjunto dos pontos da reta é infinito.
O todo igual à parte
Quando se estudam os conjuntos infinitos, aparecem surpresas. Considere-se o conjunto N dos números naturais e o conjunto P dos números pares, que está contido no. anterior. A cada número de N. corresponde um de P e um só, o seu dobro. A cada número de P corresponde um número de N e um só, a sua metade (correspondência biunívoca).
N) 1, 2, 3, ... n, ...
P) 2, 4, 6, ... 2n, ...
Isto quer dizer que P e N são equivalentes, e em conjuntos infinitos o todo e a parte se correspondem, o que não acontece em conjuntos finitos, com número limitado de elementos.
inteiros
racionais {
fracionários
Números reais {
irracionais
Uma aplicação importante da matemática é a estatística, que coleta e analisa dados referentes a acontecimentos humanos ou fenómenos naturais, a partir dos quais pode fazer previsões. Para ser útil na pesquisa, no planejamento e na fundamentação científica, a estatística precisa obter uma boa amostra, cuidadosamente selecionada, de forma a representar uma média de opinião ou situação, e capaz de refletir a totalidade dos casos. Um moderno fabricante de roupas maculinas certamente deverá conhecer a estatura média dos homens e as variações em torno dessa média. Separando, do total das pessoas que compram ternos feitos, uma amostra de cem, obtém-se um gráfico como o da figura, versão matemática da situação ilustrada acima. Esse diagrama chama-se "distribuição normal" e informa que a altura média é de 1,67 m. Dois terços dos indivíduos estão entre 1,60 e 1,75 m, e 96% num intervalo de 15 cm acima ou abaixo da média.
A extensão dos campos numéricos
As quatro operações matemáticas fundamentais são: adição, subtração, multiplicação e divisão. A estas é preciso acrescentar mais três, diretamente ligadas a elas: potenciação, radiciação e logaritmação. Em face da definição e das propriedades de uma operação, surgem certas impossibilidades que a matemática elimina apelando ao mesmo princípio de extensão, graças ao qual se criam novos campos numéricos. Para fazer frente à impossibilidade de divisão (exata) em números inteiros, foram definidos os números racionais. Este novo campo abrange o conjunto dos números inteiros e mais o formado por números fracionários(fraçoes) que são de fato os novos elementos. Aparece aí outra dificuldade; a operação de radiciação é em geral impossível no campo racional. Então êle é novamente estendido, criando-se os números irracionais (por exemplo raiz quadrada de 3, o número π). Constitui-se assim o campo real, cuja grande façanha é estabelecer uma correspondência biunívoca entre os números e os pontos da reta, integrando perfeitamente a álgebra com a geometria.
Noção de função
É a mesma e maravilhosa ideia de correspondência, nascida das contagens rudimentares do homem primitivo, que inspira o conceito de função matemática e sua representação num "sistema de referência" constituído por retas ou eixos orientados. Um objeto, abandonado em queda livre do alto de um prédio, atingirá o solo num tempo que depende do espaço percorrido. Após várias experiências, feitas de diferentes andares do edifício, teremos uma tabela que consiste em duas sucessões de números: o conjunto í (dos tempos) e o conjunto e (dos espaços), postos em correspondência um com outro. Diremos que a variável í é função da variável e e escreveremos simbolicamente: t — f (e), ou í (e).
Para representar geometricamente essa função algébrica, podem-se marcaT os diversos valores de í num eixo, os de e num outro eixo, perpendicular ao primeiro. Cada par de valores define um ponto do plano, assim como — com mais um eixo — um trio de números define um ponto do espaço. Esse sistema referencial chama-se cartesiano, por ter sido usado pela primeira vez por René Descartes, na primeira metade do século XVII. A obra de Cartesius, como era conhecido esse matemático e filósofo francês, marca uma. revolução na matemática e na filosofia: em cada ponto do mundo, êle conseguira pregar uma etiqueta identificadora. Era a completa quantificação do universo.
A estrutura da matemática
A matemática constitui uma série sempre renovada e ampliada de "julgamentos sobre fatos". O enunciado de um fato matemático é a proposição, e o processo que faz aparecer a verdade de uma proposição é uma demonstração. Uma proposição demonstrada chama-se teorema. Os objetos sobre os quais se faz uma proposição estão compreendidos numa certa "intuição", isto significando que as palavras proposição, teorema e demonstração são tomadas no sentido comum. Seus respectivos "equivalentes formais" são as palavras fórmula, tese e dedução.
A matemática como ciência é portanto constituída de proposições e demonstrações que se referem a certos objetos intuitivos. A natureza desses objetos e de suas propriedades distingue a matemática das outras formas de conhecimento. Para definir uma estrutura matemática, basta delimitar o domínio das noções intuitivas que lhe é próprio, noções "primitivas" isentas de demonstração. A evolução lógica da matemática se apresenta como uma série de reduções nos domínios intuitivos e de ampliações nos campos numéricos. E a axiomatização (ou formalização) é o termo reservado à etapa final desse processo, que se exprime na moderna teoria dos conjuntos. Nesta, a partir de uns poucos postulados ou axiomas, estabelece-se uma estrutura formal — através de símbolos operacionais — que engloba as teorias clássicas e dentro da qual as propriedades são gerais. Letras representam os elementos do conjunto, e todas as demonstrações podem ser feitas sem que se saiba qual a "natureza" desses elementos.
O nome no singular
Assim, a matemática, que no século XIX superou todos os progressos realizados em mais de 20 séculos anteriores, libertou-se da filosofia e absorveu a lógica. Ganhou uma unidade que justifica seu nome no singular. E construiu uma soberba estrutura científica, que vem sendo aplicada na biologia, na linguística e de um modo geral nas ciências da vida e da sociedade.
A linguística matemática, por exemplo, teve um impulso sensacional na década de 1950, quando surgiu o problema das traduções mecanizadas. Assim como a lógica, por muito tempo considerada especulação vazia, e que de repente se tornou essencial para o projeto e a programação dos computadores, a teoria da linguagem se transformou em elemento essencial para a máquina de traduzir, ganhando marcante interesse prático.
Enc. Delta
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