..
Revoluçao
A busca de novos caminhos
Ao longo do processo de evolução da sociedade humana, presenciamos uma luta contínua pelo controle do poder. Em todas as épocas, manifestaram-se movimentos que levam ao poder — ou afastam dele. — faraós, reis e imperadores. Na maioria não constituem, propriamente, o que chamamos hoje de revolução — são considerados apenas rebeliões ou insurreições.
A revolução, segundo o conceito atual, é um movimento que provoca mudanças bruscas, às vezes violentas, na estrutura política, económica e social de um Estado. Só na Idade Moderna surge com essas características bem definidas. O movimento considerado como padrão desse conceito é o processo revolucionário francês, que se manifestou entre 1787 e 1794, e atingiu seu ponto máximo em 1789. Por isso é também chamada "Revolução de 1789". Sua importância como marco está no fato de ter tido repercussão mundial, por sua violência e por suas causas, comuns a praticamente todos os outros movimentos que irromperam no fim do século XVIII. Os modelos de ação e ideo logia, lançados por ela, orientam os movimentos posteriores, que ocorrem por toda a Europa em 1830 e 1848. É nesse período que se formam as diferentes correntes políticas que serão responsáveis pelas revoluções modernas e contemporâneas.
Correntes da politica
Após a queda de Napoleão, o Congresso de Viena (1815) restabelece os regimes absolutistas. E logo se formam os grupos de oposição a eles. As tendências da oposição são justamente as que. marcaram as três grandes fases da Revolução Francesa: moderada-liberal, constituída pela aristocracia liberal e a alta classe média; radical-democrata, representada pela pequena burguesia e intelectuais; e a socialista, constituída pela recém-formada classe de operários industriais.
A primeira tendência inspirava-se nos ideais da fase de 1789-1791, em favor da monarquia constitucional parlamentar e do voto censitário, isto é, de acordo com a renda dos eleitores. Suas reivindicações estão contidas na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que é um mainfesto contra o poder da nobreza e da monarquia absoluta. Nele se defende, contudo, a propriedade privada, que é considerada "um direito natural, sagrado, inalienável e inviolável" e aceita-se a existência da distinção de classes.
A segunda tendência origina-se no regime de 1792-1793, tendo como objetivo político uma república democrática. Seus princípios baseiam-se na Constituição Jacobina, que previa o sufrágio universal, o direito de insurreição e estabelecia os fundamentos de uma assistência social às camadas miseráveis da população, cabendo ao governo fornecerlhes trabalho e auxílio direto. Estabelecia, ainda, a instrução pública para todos. Foi a primeira constituição realmente democrática promulgada por um Estado moderno.
A terceira tendência surge das rebeliões posteriores ao período termidoriano da Revolução, principalmente da "Conspiração dos Iguais", liderada por Babeuf em 1794. Considerava a igualdade política inseparável da igualdade social e acreditava na possibilidade de um domínio direto do povo sobre os órgãos do Estado. Preconizava uma economia controlada e a reorganização sistemática da vida social, por meio da propriedade coletiva e do ensino público obrigatório, para a transformação da mentalidade das massas. Representa o início de uma linha socialista de pensamento..
Apesar das diferenças nas linhas políticas, todas essas tendências uniam-se diante do inimigo comum, a monarquia absolutista. Embora se guiassem por princípios estabelecidos na Revolução de 1789, as revoluções do século XIX eram planejadas e cuidadosamente estudadas, baseando-se nos modelos por aquela oferecidos.
As sociedades secretas
O período de 1815 a 1830 é marcado pelas conspirações seguidas de tentativas de estabelecer a "monarquia constitucional em toda a Europa. A oposição à restauração do absolutismo resumia-se, em geral, a grupos formados por intelectuais e pessoas ricas, seguidores da linha radical-democrática. Mas suas reivindicações limitavam-se ao plano político; não apresentavam programa algum de modificações sociais em outros setores. Com exceção da Inglaterra, onde a situação política e económica era peculiar, não havia diferenças flagrantes entre as correntes oposicionistas europeias. Os revolucionários consideravam-se como grupos decididos à luta pela emancipação da massa que, embora lhes fosse favorável, nada faria para participar ativamente da luta. Encaravam a re-v volução como um fenómeno europeu, um movimento global indivisível, e não local ou nacional. Adotavam, inclusive, a mesma forma de organização: a sociedade secreta insurrecional.
A mais conhecida dessas sociedades foi a dos "carbonários", assim chamados por ser constituída de lenhadores carvoeiros (carbo-nari, em italiano), que se reuniam nos bosquês. Esse grupo formou-se na Itália, depois de 1806, e estendeu-se por toda a Europa a partir de 1815. Alcança seu apogeu no período de 1820 a 1821, sendo que muitos de seus organismos foram virtualmente destruídos em 1823. Mas permanece como linha de organização revolucionária muito importante, até depois dos movimentos de 1830. Era formado por grupos heterogéneos; no entanto, estavam todos unidos pelo ideal comum de oposição ao absolutismo.
A vitória dos movimentos revolucionários, ainda que passageira, dependia da adesão da classe militar. Na França e na Rússia, por exemplo, onde não foi conseguida, fracassaram. Já na Espanha, Nápoles e Sardenha, onde foram apoiados pelos militares, são vitoriosos; e conseguem forçar os soberanos absolutistas a promulgar constituições ou restabelecer as que haviam sido abolidas. A adesão da classe militar a esse movimento explica-se por sua composição, pois nela havia grande número de oficiais não-aristocratas.
Por volta de 1823, entretanto, todos os regimes constitucionais haviam sido derrotados, devido à intervenção estrangeira: da França na Espanha e da Áustria na Sardenha e Nápoles. Somente a revolução grega de 1821 conseguiu manter-se, isso porque não apenas desencadeou a revolta popular geral, mas contou também com o apoio de grandes potências. A Rússia, a Inglaterra e a França, empenhadas no enfraquecimento do Império Otomano, do qual a Grécia fazia parte, não hesitaram em ajudar o movimento rebelde.
A fase revolucionária
Por toda a Europa rebentam movimentos revolucionários em 1830 e 1848, num clima de inquietação social e económica provocado pelas transformações que marcaram o fim do século XVIII e princípios do XIX. São repercussões de uma nova revolução, mas esta de natureza bem diferente: a chamada Revolução Industrial.
No plano político, as transformações de estrutura que caracterizam a nova era industrial tornam possível a revolução de massas, no modelo da de 1789; a atividade das sociedades secretas torna-se desnecessária. Por outro lado, o desenvolvimento urbano atraí para as cidades a mão-de-obra dos campos. Dessa forma, passa a delinear-se uma nova estrutura, mais adequada à realidade industrial. As linhas políticas dividiram a Europa em duas grandes, regiões; na área a oeste do Reno, predominam as tendências liberais. A leste do Reno a situação continua como antes: todos os movimentos contra o absolutismo, que ainda perdura, são derrotados pelos austríacos e russos.
Contra a monarquia
Uma reação nacionalista contra o inter-nacionalismo carbonário ganhou terreno e captou grande parte da esquerda europeia, após 1830. Os liberais ainda aceitavam uma possibilidade de conciliação. Acreditavam que se o monarca aceitasse pautar seu governo por uma constituição democrática, era bastante viável e até mesmo desejável que ele se mantivesse no poder.
Mas os radicais não aceitavam a confiança dos liberais nos príncipes e potentados. Achavam que os povos deveriam preparar-se para conquistar a liberdade por seus próprios esforços e não esperar que alguém lha quisesse outorgar. O mesmo sentimento era professado pelos socialistas, herdeiros do chamado babeuf ismo, a linha liderada por Babeuf na terceira fase da Revolução Francesa.
O princípio da revolução social dividiu os radicais da classe média, na França, homens de negócios e intelectuais, que se opunham aos governos liberais moderados. Na Inglaterra, a maior parte da oposição liberal' colocou-se contra os movimentos das classes trabalhadoras.
Apesar de divididos pelas condições locais, pelas nacionalidades e pelas classes, os movimentos de 1830 e 1848 conservavam muitas coisas em comum. Continuavam sendo, cm sua maior parte, organizações em que predominavam a classe média e os intelectuais. Ao estourarem as revoluções, o povo muitas vezes unia-se a elas; mas em geral não participava ativamente da elaboração do movimento. E o padrão de estratégia e tática mantinha-sc o mesmo, com base na experiência herdada da Revolução de 1789, quaisquer que fossem suas linhas, moderadas ou radicais, conforme a situação política e social de cada país.
As palavras de ordem da Revolução Francesa mobilizavam grandes setores da população. Isso era compreensível, uma vez que seus princípios — liberais e igualitários — não se haviam concretizado ainda na maior parte da Europa. Em 1848, somente a alta burguesia participava do setor governamental; e, mesmo assim, apenas em alguns países. A monarquia absoluta e a aristocracia ainda perduravam em muitos lugares. Portanto, permanecia ainda como reivindicação atua] a liberdade de expressão, a igualdade de oportunidades, que eram o objetivo da luta em 1789.
Dessa forma, todo o cenário político europeu foi, pelo menos até 1848, dominado por objetivos e métodos surgidos na grande Revolução Francesa. Pouco a pouco, os métodos e mesmo os objetivos foram sofrendo transformações. No final do século XIX e no decorrer do século XX, os movimentos revolucionários, em todo o mundo, assumiriam novas características. Para isto, contribuiriam as grandes transformações no campo económico e social, derivadas da industrialização crescente, e a queda da monarquia, na maior parte dos países.
..