4.3.09

Pao!

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Genesis, capitulo III. Deus expulsa Adão do Paraíso: "Com o suor do teu rosto comerás o pão, até que voltes à terra donde foste tirado..." O pão está presente entre os povos do Oriente Próximo desde a Antiguidade. "Comereis pães ázimos durante sete dias..." diz Moisés, instituindo a Páscoa entre os hebreus (ázimo, do grego, significa sem fermento). Está ligado à fuga do Egito esse hábito dos hebreus de alímentarem-se exclusi­vamente de pães ázimos durante as festas religiosas. Devido à pressa, tiveram que partir levando pães que ainda não tinham fer­mentado.
Não é só por causa da Biblía que sabemos qual a idade do pão. Escavações arqueológicas revelaram que muito antes de Moisés êle já era conhecido. Por volta do ano 10 000 a.C, os povos que habita­vam a região da atual Suíça já fabricavam uma espécie rudimentar de pão, cozido entre duas pedras quentes.

A leitura da Bíblia leva-nos a crer que os hebreus foram os responsáveis pela descoberta e divulgação da massa fermentada. A massa composta de farinha e água contém certa quantidade de açúcar, procedente do amido do trigo, e de levedura, pequenas plan­tas vivas. Quando deixada durante certo tempo num lugar quente e úmído, a levedura produz uma substância química que altera o açúcar, transformando-o em álcool. Nesse processo há desprendi­mento de gás carbónico, formando bolhas que aumentam o volume da massa.
O processo de fermentação natural levou os antigos à ideia de misturar a massa fermentada à outra, sem levedura, para obter pão mais leve e melhor. Pães como esse foram fabricados durante séculos. Em nada se assemelhavam, no entanto, aos que conhecemos hoje. Eram achatados, mais parecendo tortas. Coziam-se na lareira, sob cinzas ou pedras aquecidas.
Os egípcios, famosos agricultores e divulgadores da cultura de cereais, modernizaram a técnica da fabricação do pão. Pinturas encontradas sobre tumbas de reis, que viveram há cerca de 2 500 anos a.C, mostram como funcionava o sistema egípcio. Um conjun­to de pedras acionado a mão triturava os grãos. Reduzido a farinha, o trigo era peneirado, libertando-se de cerdas e farelos. Misturado com água, transformava-se numa substância mole, amassada em grandes vasilhas de barro. O cozimento era feito em moldes também de barro, previamente aquecidos.
Guerras, transformações. O pão expande-se por todo o Oriente Próximo e atinge o Ocidente. Na Grécia sua qualidade é aprimora­da e diversificada. Fabrica-se o pão de cevada, com e sem fermento. Pela primeira vez é feito pão de centeio. Enriquecido com aromas, é cozido, a princípio, entre placas de pedra. Depois, sobre pedras cobertas com uma espécie de redoma. E finalmente em fomos apropriados.
Além de aperfeiçoarem o sistema de cozimento, os gregos foram os primeiros a cuidar de pastelaria e várias espécies de biscoito. No período precedente à chegada dos romanos, conheciam 72 espécies de pão e bolo.



A escola de padeiros
Por volta do ano 800 a.C, produção e consumo de pão ganharam novo impulso. Desta vez, entre os romanos. Em 500 a.C, apareceram fornos de alvenaria em Roma e foi criada a primeira escola de padeiros da História. Era privilégio ser membro dessa escola: o pão, base da alimentação romana, tornara-se matéria importantíssima. As pani­ficadoras sofriam controle rígido. Surgiram leis trabalhistas especiais para os padeiros e suas famílias. Filho de padeiro não podia entrar em ordens sacerdotais nem em ne­nhuma outra instituição: tinha que ser pa­deiro. Só havia exceção para os que tinham servido com mérito à República. Estes po­diam tornar-se até senadores.
No ano 30 a.C, existiam 329 panificado­ras cm Roma, produzindo farinha e pão. No monumento funerário de um padeiro, em Roma, foram encontrados desenhos que mostram o equipamento e as sucessivas ope­rações por que passava o fabrico do pão:
— chegada e trituração dos grãos;
— moedura, realizada num moinho de madeira primitivamente movido por escra­vos e, depois, por um cavalo;
— peneiração, realizada manualmente;
— preparação da massa numa gamela, trabalhada por um agitador mecânico, movi­do a cavalo;
— colocação da massa em formas, que eram introduzidas nos fornos de alvenaria;
— controle do peso e venda dos pães.

Os pães dos antigos romanos eram mais parecidos com os de hoje: pequenos, fofos e arredondados. Sabe-se disso porque muitos deles foram encontrados, petrificados, nas ruínas de uma padaria em Pompéia, cidade romana que foi destruída por uma erupção do Vesúvio.
Antes de sua queda, os romanos introdu­ziram o pão na Gália. E também aí o pro­cesso de fabricação continuou o mesmo, até o século V.

Novos tempos, nova ordem
O pão, os métodos e recursos para obtê-lo passaram por transformações marcantes du­rante a Idade Média. Para proteger e afir­mar a profissão de padeiro, surgiram as "corporações". Seu objetivo era definir os direitos e deveres dos profissionais da pani­ficação. Compunham-se de aprendizes, mes­tres e servos. Os aprendizes levavam de três a cinco anos para aprenderem a arte da panificação. Os mestres eram proprietários e administradores do matéria! empregado na panificadora. Os servos exerciam as funções principais, sem terem, no entanto, o direito de ensinar os aprendizes.
A rigorosa hierarquia das corporações, que impedia uma ascensão igual para todos os elementos da profissão, fez com que sur­gissem, no século XIV, as "associações de companheiros". Estas reestruturaram as cor­porações, dando aos servos o direito de for­marem aprendizes.
Nas regiões rurais, os processos de panifi­cação continuavam praticamente os mesmos dos romanos. Mas nas grandes cidades hou­ve modificações constantes, provocadas pelo progresso da técnica. Os processos mecani­zaram-se. A levedura de cerveja começou a ser empregada na fermentação da massa, o que resultou em pães mais leves e mais sa­borosos. Entrou o sal, pois descobriu-se que seu emprego dava mais corpo à massa.
Em 1630, apareceu na França um pão de luxo, feito com sal, leite e levedura de cerve­ja. Por ser muito apreciado pela Rainha Maria de Medíeis, foi chamado "pão da rai­nha". Outro tipo de pão, justamente oposto ao de luxo, tornou-se famoso também na França. Nele eram misturados todos os cereais disponíveis: era o chamado "pão da privação-".
Apesar das modificações introduzidas nas corporações, continuavam os abusos e pro­blemas causados pela hierarquia profissional. f,sse problema só foi superado com a Revo­lução Francesa. Em 1791, as corporações fo­ram definitivamente extintas. Os antigos direitos de exercer a profissão de panificador foram substituídos pela imposição da paten­te, lei que vigora até hoje. E surgiram os primeiros sindicatos de padeiros.


Na era da máquina
No século XIX. aparece a amassadeira mecânica. Seu emprego é difícil e sua manutenção muito cara. É movida manual­mente ou por sistema hidráulico, o que, num ambiente artesanal, é pouco praticável. Além disso, os consumidores mostram-se hostis ao pão fabricado "mecanicamente". Em fins do século XIX, o aparecimento do motor elétrico favorece o emprego da amas­sadeira. Mas esta continua a enfrentar hos­tilidades, agora por parte dos profissionais. Eles afirmam, revoltados: "Quando uma amassadeira entra pela porta, dois operários saem pela janela".
Apesar de todas as dificuldades, assim que termina a I Guerra Mundial a amassadeira mecânica é definitivamente aceita. E passa a ser usada em grande escala. Por- volta de 1943, começa a trabalhar pelo sistema pneu­mático. Governos incentivam a produção do pao em escala industrial. E chega-se à produção atual, altamente automatizada.
Hoje, quando o trigo chega ao moinho, uma série de engenhosas máquinas come­çam a limpá-lo, deixando-o livre de qual­quer elemento estranho. Escovado e lavado, o grão passa para os moinhos de cilindros, onde as partes que o compõem são separa­das. Só as melhores são convertidas em farinha.

E o pão se faz
O primeiro passo para a fabricação do pão, propriamente dito, é dado nos tanques de mistura. Aí se encontram água, sal, fer­mento e substâncias enriquecedoras, Essa mistura fica em fermentação durante certo tempo, sob temperatura constante. Uma vez avançado o processo, a mistura é adicionada à farinha numa pré-misturadora, para a for­mação da massa.

Da pré-misturadora, a massa vai para a amassadeira. Em seguida, é cortada em pe­daços que são pesados e colocados em mol­des. Cheios, os moldes avançam por uma esteira transportadora para sofrerem a fer­mentação total, sob temperatura rigidamen­te controlada. Sempre através de máquinas, os moldes passam aos enormes fornos, para o cozimento, que é feito ao ritmo de 3 mil pães por hora. Também o tempo de cozi­mento é rigidamente controlado. Depois de cozido, o pão segue, ainda por esteiras rolan­tes, para outras máquinas que irão cortá-lo em pedaços e embrulhá-lo.
Numa indústria panificadora moderna as mãos humanas apenas apertam botões e pu­xam alavancas, sem jamais tocarem no pro­duto. Isso não acontece, no entanto, nas pa­darias comuns, que fornecem pão às resi­dências. Essas, na maioria, conservam os métodos primitivos de fabricação. Aliás, a panificação é uma das técnicas que mais conserva as características de artesanato.
Muitos tipos, sempre pão
O pão de trigo é o mais comum, mas mui­tos outros tipos são consumidos em grande escala. O de centeio e o de cevada, por exemplo, puros ou misturados com farinha de trigo. Na Escócia fabricam-se broas de aveia e pães de cevada, conhecidos como "bannock". Na Alemanha, União Soviética e países escandinavos, é muito popular um pão preto feito com centeio, ao qual às vezes é adicionada farinha de cevada e de bata­ta. Em Portugal, 50 por cento da popula­ção consome diariamente broas e pães de milho. No Nordeste do Brasil a culinária popular consagra o "cuscuz de fubá de mi­lho", um tipo de pão muito nutritivo e de grande consumo.
De maneira geral, são duas as espécies mais conhecidas de pão: o completo ou inte­gral e o branco. O branco é condenado pelos nutricionistas por ser pobre em vitaminas. A farinha branca, da qual é feito, provém apenas do endosperma farinhoso do grão de trigo. O germe, que contém proteína e gor­dura, é removido junto com a casca. O re­sultado é uma farinha pura, mas um alimen­to fraco. O pão escuro, por ser feito com cereais integrais, tem tudo o que falta ao pão branco em vitaminas e proteínas.
Em muitos lugares do mundo tentaram corrigir as desvantagens do pão branco, enri­quecendo-o cqm vitaminas, cálcio e ferro. Ainda assim, os nutricionistas prosseguem achando que, mesmo enriquecido, continua muito pobre, comparado ao pão integral.


Enc. Conhecer/ abril
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