4.3.09

Sociedades Secretas

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Década de 50, século XX. A Argélia luta por sua independência, tenta livrar-se do domínio francês. Uma ala do Governo francês é a favor das ne­gociações de paz com a colónia. Outra in­siste na preservação da Argélia Francesa. Pressionado pela opinião pública interna­cional e pelo alto custo da guerra, de Gaulle vê-se obrigado a negociar com a Argélia. Com o intuito de impedir que isso aconte­ça, surge em 1961 uma organização secreta formada por oficiais franceses irredutíveis: a O.A.S. — Organisation de VArmée Secrète. Sabotagens, rebeliões, atentados con­tra a vida do presidente, tentam tudo. Mas de Gaulle vence. Em 1962, a Argélia tor­na-se independente. A causa da criação da O.A.S. deixa de existir e o movimento pou­co a pouco se extingue.
A O.A.S. é um exemplo típico do agrupa­mento social chamado "sociedade secreta".


Política, religião ou crime
Desde a Antiguidade, há registro do que hoje é caracterizado como "sociedade secre­ta". Organizações desse tipo existiram no Oriente — China, Japão, índia — como no mundo clássico de gregos e romanos. E não deixaram de aparecer no Egito, Assíria e Pérsia antigos. Sempre provocaram muitas e ferrenhas controvérsias entre os estudio­sos. Houve tempo em que eram identifica­das com os mais diversos agrupamentos hu­manos, bastando que suas atividades esca­passem ao domínio público. Aos judeus eram atribuídas "atividades misteriosas". Ordens religiosas eram acusadas de "peri­gosos exercícios subterrâneos". Mas associa­ções não-oficiais nem sempre constituem de fato sociedades secretas. Muitas vezes são organizações que teriam agido às claras, em tempos normais. A clandestinidade é im­posta pelas circunstâncias, é o caso dos cristãos, durante certo período do Império Romano, ou dos protestantes franceses, até o Édito de Nantes.
Entre as verdadeiras sociedades secretas podem-se distinguir três tipos: as de obje-tivo político ou social, as de iniciação e as criminosas. De uma a outra seus membros variavam e variam, de idealistas cheios de ge­nerosidade a psicopatas ansiosos por mu­danças até absurdas.
As sociedades secretas de objetivos políti­cos e sociais caracterizam-se principalmente por sua duração limitada. Formam-se para combater determinada situação política ou social vigente e agem na marginalidade; dis­simulam suas atividades e o nome de seus membros, mas duram apenas enquanto per­manece a causa de sua criação.
As sociedades secretas de iniciação, ao contrário das de objetivo político, não pro­curam esconder sua existência, suas leis, locais de reuniões e nome dos adeptos. Guar­dam segredo apenas de suas cerimónias e atividades, vedadas aos "profanos". Os mem­bros identificam-se, em qualquer lugar on­de se encontrem, por sinais e toques, senhas que servem como código de reconhecimento,
Em geral, o objetivo das sociedades secre­tas de iniciação é a elevação do indivíduo a um "estado psíquico superior". Através de complicados rituais, que incluem provas físicas e morais, o iniciado sente que deve "morrer" a fim de "renascer" para uma no­va vida. Só uma organização pode "iniciai" o indivíduo, daí a característica de socie­dade. Por não ter objetivo imediato, como nas sociedades secretas políticas, sua dura­ção é mais longa. Mas há ocasiões em que uma sociedade de iniciação passa a agir tam­bém como sociedade secreta política. Só que não se extingue se o objetivo político é al­cançado. Seus membros continuam a reu­nir-se e realizar rituais. É o caso da maço­naria, sociedade secreta internacional de ini­ciação, cujos membros influíram na evolu­ção política de vários países.
As de objetivo criminoso também são du­ráveis, embora os governos se empenhem em eliminá-las. Em nome da organização, seus membros cometem a mais variada sorte de crimes. O principal estatuto das sociedades secretas criminosas é o que obriga seus adep­tos a sigilo absoluto sobre a existência da "irmandade" e suas atividades. Aquele que revelar segredos proibidos é sumariamente eliminado. A Máfia, nascida há mais de um século, continua sendo até hoje uma das mais poderosas sociedades secretas do crime.

A união da cruz com a rosa
Esse foi o símbolo adotado pela sociedade dos rosa-cruz: uma cruz vermelha, "pois que foi salpicada pelo místico e divino san­gue de Cristo", e uma rosa, "signo de pu­rificação de toda mácula".
A primeira notícia que se tem a respeito dos rosa-cruz data de 1614, quando foram publicados três livros relatando a sua fun­dação — atribuída ao alemão Christian Ro-scnkreutz (c. 1378-c. 1485) e parte de suas origens, vindas do Oriente. Como socie­dade de iniciação secreta, sabe-se apenas que os ritos têm por fim a elevação espiritual.

Na origem, pedreiros
A palavra maçon, na origem francesa, sig­nifica pedreiro Qmason, em inglês). A Ma­çonaria, sociedade secreta de iniciação, nas­ceu na Inglaterra. Ao que se presume, des­cende das antigas corporações de ofício me­dievais, onde os construtores reuniam-se sob uma mesma direção, obedecendo a um re­gulamento comum. Essas corporações garantiam certa liberdade aos seus membros e respeitavam uma hierarquia: mestre, oficiais e aprendizes. Expandindo-se para a França, foi consolidada na Franco-Maçonaria, que conservou a mesma hierarquia das antigas corporações, absorvendo alguns rituais e crenças dos rosa-cruz. Reunindo-se em lu­gares chamados "lojas", os maçons realizam cerimonias ritualísticas, próprias às associa­ções secretas de iniciação. Mas muitas vezes a sociedade ultrapassou seu caráter mera­mente místico para influir decisivamente em movimentos políticos.
É tida como certa a participação da ma­çonaria nos movimentos que culminaram com a Inconfidência Mineira, até a procla­mação da Independência, por D. Pedro I. Após o 7 de Setembro, o imperador foi em­possado no posto supremo da Ordem dos Maçons.

Lenhadores carvoeiros
Da reunião de profissionais nasceu tam­bém a sociedade secreta dos carbonários. Provavelmente o nome tem sua origem na legendária Sociedade dos Lenhadores ou Car­voeiros, uma espécie de confraria de homens que se tinham retirado da civilização para executar seu trabalho humilde em meio às florestas. Essa sociedade florestal mantinha reuniões ao ar livre, onde realizava cerimó­nias de "iniciação" e contava com um com­plicado sistema de misteriosos sinais e se­nhas de reconhecimento.
Calcada na prática dos lenhadores c outros trabalhadores das florestas c cm alguns ri­tuais da maçonaria, a sociedade dos carboná­rios foi fundada em Nápoles, em 1814, com a intenção de expulsar os austríacos do solo italiano, derrubar as monarquias protegidas pela Santa Aliança e estabelecer um governo democrático na Itália.
O poderio dos carbonários cresceu e se expandiu com rapidez incrível. Em algumas cidades da Calábria c dos Abrazos, prati­camente toda a população masculina foi "iniciada". A Sociedade recrutava adeptos de qualquer profissão e classe social, dan­do-lhes instrução militar. As faltas cometi­das pelos filiados eram julgadas num tribu­nal secreto.
Em 1820, o movimento expandiu-se para a França, onde trabalhou para derrubar o Governo da Restauração. Com a queda dos Bourbons, a Sociedade perdeu sua razão de existir nesse país. Mas continuou na Itália, onde seus objetivos ainda não tinham sido atingidos. Em 1834, foi absorvida por ou­tro movimento, também secreto, a Jovem Itália, dirigida por Mazzini. A nova orga­nização secreta continuaria o trabalho dos carbonários. Mais tarde, o movimento se estende por outros países europeus, com os mesmos objetivos liberais, sob o nome de Jovem Eitropa.

A dura lei da Máfia
Pressionada pelos exércitos de Napoleão, a corte de Nápoles do século XIX refugiou-se na Sicília. Na época, a ilha estava infes­tada de salteadores. Não dispondo de forças suficientes para manter a ordem, o soberano tomou a seu serviço algumas quadrilhas, que foram incumbidas do policiamento da ilha. Mais tarde, quando o Governo siciliano quis voltar à administração normal, as quadri­lhas estavam tão fortemente organizadas que subsistiram. Não mais a soldo do Governo, os bandoleiros continuaram a agir por conta própria; e o número de componentes au­mentava sempre. A extrema miséria que reinava na Sicília facilitava o movimento clandestino. Pertencer a essa classe de re­voltados contra a lei e a ordem estabelecida era um fato enobrecido pelos humildes. As­sim se formou a Máfia, até hoje uma das mais poderosas organizações secretas do críme. Para assegurar sua sobrevivência, num mundo cuja lei seriam eles próprios, os inafiosos criaram um código rígido, e a de­sobediência a êle significava pura e simples­mente a morte. Esse código, até hoje obser­vado, chamava-se omertà, que no dialeto sicíiiano significa "conspiração do silêncio". Compreende cinco regras-chave: ajudar um irmão cm dificuldades com todos os meios que estiverem ao alcance; obedecer sem discussão às ordens de um "conselho de irmãos" que lhe seja superior; estar pron­to a vingar, a qualquer preço, a ofensa feita por um estranho a um irmão; nunca recor­rer à polícia ou à justiça para o reconheci­mento de seus direitos, sejam quais forem as circunstâncias; sob pena de morte, jamais confessar a existência da irmandade, nem o nome de um irmão.
Com o início da migração italiana para os Estados Unidos, muitos elementos da or­ganização transferiram-se para esse país. En­tre êtes os famosos gangsters Al Capone e Lucky Luciano, Até 1920, o trabalho da Máfia nos Estados Unidos esteve limitado. Com a criação da. Lei Seca, abriu-se novo panorama, com enormes possibilidades para o ganho desonesto. Formaram-se as primei­ras quadrilhas, que se desenvolveram e mul­tiplicaram de maneira incrível. Penetraram profundamente na vida económica do país.

Ku Klux Klan: o terror
Com a derrota dos escravocratas na Guer­ra da Secessão americana, os brancos do Sul dos Estados Unidos viram-se diante de ex-escravos negros que passaram a ter os mes­mos direitos políticos. Indignados diante desse Fato, alguns oficiais do exército con­federado resolveram fundar em Nashville (Tennessee), em 1865, uma sociedade secre­ta para lutar contra a influência dos negros nos caminhos da nação: a Ku Klux Klan.
A princípio, a Ku Klux Klan iimitava-se a atemorizar os negros, recorrendo a caval­gadas noturnas à luz de tochas, com vestes e capuzes brancos. Mas em pouco tempo o ataque passou a ser direto: banhos de pi­che e açoites, linchamentos c assassínios sistemáticos. Com a retirada das tropas fe­derais dos Estados do Sul e a diminuição gradativa dos poderes concedidos aos negros, os brancos reconquistaram sua antiga pre­ponderância económica e social. Desorgani­zada, a sociedade foi dissolvida pelo General Nathan Bedford Forrest, em 1871. Mas res­surgiu após a Primeira Guerra Mundial; e com mais força.

Em 1916, trinta e quatro homens, lide­rados pelo pastor metodista William Joseph Simmons, plantaram no alto da montanha que domina a cidade de Atlanta, na Geórgía, uma cruz incandescente. Vestidos de bran co e encapuzados, juraram restaurar a orga­nização. Os métodos continuaram os mes­mos, mas agora a fúria estendia-se não só aos negros, mas também a judeus, católicos e imigrantes recentemente instalados no país. Em 1944, o que restava do movimento aca­bou por se dissolver. Mas em 1960, os pro­blemas surgidos com os direitos civis dos ne­gros fizeram com que o terror voltasse. Em­bora vigorosamente combatida pelo Gover­no e pelo Poder Judiciário, a Ku Klux Klan ainda contava, em 1966, cerca de 30 mil adeptos, principalmente na Geórgia, Carolina do Norte, Alabama e Mississipi.

Enc. Conhecer/ abril
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